Sou da época em que falar sozinho era coisa de maluco. Hoje em dia, todos admitem que, vez ou outra, conversam consigo mesmos. Virou cult. Mas é como evacuar: as pessoas podem saber que fazemos, mas não precisam ver. Não podem. É proibido. Quando percebemos, na rua, alguém que fala sozinho, classificamos imediatamente como doido. Então, a questão mudou: o problema não é mais falar sozinho, é ser flagrado no ato.
A contemporaneidade trouxe ainda outra questão: na Internet, o que a gente mais faz é falar sozinho. O que é, senão, um blog? Um monte de textos postados, que podem não ser lidos por ninguém. Escrever aqui é como falar sozinho, não? Com sorte, alguém me lê e me torna menos doido. Não concorda?
Ok. Talvez escrever seja um caso à parte. Mas e o caso dos vlogueiros? Na maioria dos casos, eles gravam vídeos fazendo exatamente isso: falar sozinho. E falam, falam, falam, com argumentos e indignações típicos de um diálogo. Ainda que possam ser assistidos depois no Youtube, o monólogo não é ouvido por ninguém no momento da gravação. Isso é falar sozinho, sim. Pior: é falar sozinho e ser flagrado. Corajosa essa gente.
Ainda nessa linha, o que é o Twitter se não um manicômio? É um monte de gente falando sozinha, com a possibilidade de interação. Você escreve o que pensa, o que faz, o que gosta e o que não gosta, como se alguém estivesse interessado. Mesmo no caso das contas com milhões de seguidores, é um tiro no escuro.
No cotidiano real, físico, no entanto, ainda é um mito a questão do flagra. Eu não falo sozinho. Eu ensaio diálogos e discussões. Imagino o que falarei e as respostas que obterei, com réplicas e tréplicas. É uma prévia do que acontecerá e do que pode nunca acontecer (quase sempre). Ou seja, não falo sozinho, mas falo com pessoas que não estão presentes – o que também é insano. Obviamente, é algo íntimo. Obviamente, não quero ser flagrado no ato. Mas, com certeza, sempre me pegam com a boca na botija.